Máquinas Fotográficas


Autor: Mário Bock

 

Tem gente quês se sente mal naquele quartinho. Outros se surpreendem e aplaudem. E não é para menos, em um pequeno espaço estão nada mais nada menos do que 1.186 máquinas fotográficas e filmadoras de quase todos os tipos. Se não é a maior ou a mais rica, a coleção de Mário Bock certamente destaca-se pela variedade de modelos – das pioneiras máquinas de fole às clássicas Leica e Rolleiflex. São relíquias que documentam a incrível história das máquinas fotográficas do País.
E porque alguém se sentiria mal no quarto? Bem, é que são mais de mil lentes enquadrando o visitante – e tem gente que não se sente tão à vontade com essa, digamos, exposição. Mas não há o que temer: a maioria das máquinas, embora em bom estado de conservação, estão aposentadas e para a maioria nem existe mais filmes e chapas apropriados.

 

LONGE DO FERRO VELHO   
     

         A exemplo de um colecionador de bicicletas, que comprava aquelas mesmo impossíveis de serem recuperadas só para não vê-las apodrecer no ferro-velho, uma coleção de máquinas fotográficas não ostenta somente máquinas raras, valiosas ou impecáveis, ou em estado “mint” – como se tivessem saído naquele dia da fábrica. Isso existe, é comum para os que vêem em uma coleção de peças em ótimo estado, um investimento de retorno garantido. Mas está fora do alcance da maioria dos colecionadores. E também não tem muita graça...
         O gostoso é o colecionador “amar” cada peça adquirida. Mesmo que sejam os restos do que foi uma rara câmara de fole e que se deteriorou com o tempo. Uma coleção como essa pode ser montada a partir de constantes “expedições de garimpo” em feiras de antiguidade de São Paulo e outras grandes cidades do Brasil, vendas de garagem (“família” vende tudo) e bazares de caridade. É impressionante como a cada final de semana esses locais oferecem “novidades” em máquinas antigas, clássicas, quebradas e “aposentadas” – um prazer redobrado para o colecionador.
         Muito melhor ainda se a máquina adquirida necessita mesmo de algum cuidado e carinho, como limpeza e polimento. É nesse contato que o colecionador “conversa com a máquina” para compreender o funcionamento. É limpando as lentes que se transporta para a época do preto & branco, quando as coisas pareciam mais saudáveis e românticas.

 

RARIDADES NAS PRATELEIRAS

Na coleção de máquinas fotográficas como esta, por exemplo, entra qualquer tipo, marca e ano de fabricação de máquinas, sem restrição. O “museu” tem até máquinas fotográficas rejeitadas desde que foram lançadas, de tão ruins que eram. É ocaso das brasileiras Flika, Tuka e Bieka. Mas em nome da história, são colecionáveis todas as máquinas com mais de dez anos – podem ser quebradas, por que, não? – no que se incluem câmaras de amador de formato 110 (as Kodak Xereta) e as Love descartáveis, as Intamatic (Kodak Tira Teima); as Tekinhas no formato 126 e mesmo as mais simples (e baratas na época) de 135 mm, como as Olympus Trip e Pen – muito conhecidas pelos brasileiros. As Canonet e as Yashica Eletro 35, de foco por telêmetro que tanta alegria deu aos fotógrafos contemporâneos, também estão lá, no “museu”, curtindo uma merecida aposentadoria.
         O mesmo vale para as famosas máquinas “caixão” (de metal ou papelão) – em formato de caixa – muito simples, que sofreram nas mãos da garotada desde o inicio do século, até os idos de 1950, quando fez o maior sucesso a Kapsa brasileira. Também dessa época são as  máquinas simples de baquelite com filme 120, como as Agfa, de preço até hoje muito acessível.
         Mas o “must” da coleção são mesmo as máquinas de fole, aquelas de sanfoninha que foram fabricas em inúmeros modelos e formatos, de madeira ou de metal, das mais simples às com muitas regulagens e cromados. São maioria as Kodak americanas fabricadas na década de 20/30 até 1950. Porém, as melhores eram mesmo as alemãs Voigtländer, Goerz, Agfa, Ernermann e tantas outras, de alta precisão e qualidade ótica impecável.
         Entre as máquinas de fole, destacam-se (e são mais rarase, portanto, mais caras) os modelos de formato horizontal, com fole vermelho e, principalmente, as que tiram fotos com negativo de vidro. Elas são o destaque da coleção, pois são um pouco maior que  as demais, tem lentes de alta qualidade e o fole pode ser extendido para até 30 cm. Na época, décadas de 20 e 40, eram consideradas profionais, caras e tão sonhadas pelos como as ânon e Nikon de hoje.

 

O SONHO NÃO MORREU

Para alegria dos velhos fotógrafos, a coleção conta com algumas maravilhas de sua época: Zeiss Ikon Super-Ikonta (de fole), câmeras “caixote” Detetive (com capacidade para tirar “seqüências” de 10 chapas de vidro, sem recarregar), a Kodak Retina e Medalist (de filme 620), entre outras.        
Outro destaque são as Speedgraphic americanas, volumosas máquinas de reportagem da década de 40 que sempre aparecem em filmes de época (especialmente de mafiosos) em que os fotógrafos são identificados por um cartão com a palavra PRESS colocado no chapéu. As Speed eram máquinas de qualidade (complicadas de usar), usavam chapas de vidro e chamavam atenção pelo enorme flash de lâmpada.

 

O MUSEU COMPLETO

A coleção abriga máquinas fotográficas “antigas”, mas ainda em uso, como as fantásticas Asahi Pentax (com 30 anos de mercado), além de modelos Nikon e Canon com mais de 25 anos. Da mesma forma, o “museu” ficaria desfalcado se não expusesse as câmeras de duas lentes Flexaret e linha Yashica 6 x 6 (como os modelos D, E e  Mat) que fiserem furor lá pelos idos de 1970.
Há ainda uma seção de máquinas miniaturas que cabem na palma da mão, como a Minox (usada até em espionagem), Yashica Atoron e Minota 16 – além de minúsculos modelos japoneses (identificadas pelo “made in occupied Japan”, ou seja, feitas na época em que o Japão era ocupado pelos americanos). Outra marca de uma boa coleção são as peças exóticas. No caso de máquinas, uma National 110 com radio, as Kodadk 126 (nacionais de 1992) “fantasiadas” de Mickey, Minnie e Baby Sauro (do seriado Família Dinissauro). Sem falar das primeiras Polaroid, grandes e desajeitadas.

 

COLEÇÕES PARALELAS

Por ultimo em qualquer coleção, os assessórios devem obrigatoriamente fazer parte do acervo, pequenas coleções “paralelas” enriquecem a principal: dezenas de filme, de filmagem e fotografia (inclusive chapas de vidro), conservadas virgens. A embalagem atesta a antiguidade pela data de impressa, como 1936, por exemplo. Incluem-se também raríssimos daguerreotopios (as pioneiras fotos em chapa de metal reveladas em vapor de mercúrio); inúmero fotômetro para medição de luz; flashes com refletor em leque; filtros coloridos; objetivas variadas; negativos de vidro revelados; garrafas muito antigas com as químicas da época usadas em laboratórios fotográficos; alem de carretéis de madeira usados para enrolar os filmes no começo do século IXX..
Não precisa ser uma valiosa Leica. Pode ser uma simples Kodak Rio 400 de plástico (de 1965) ou um mal cheiroso lambe-lambe dos velhos fotógrafos de Aparecida (SP). O que vale numa coleção é, sobretudo, a satisfação do colecionador, nem sempre compreendido.

 

MÁQUINAS QUE MARCARAM ÉPOCA

1900 – 1930

De fole (sanfoninha) Kodak, Zeiss, Voigtlander, Ica e Goerz.
Época das grandes máquinas alemãs de fole, de madeira, e que usam chapas de vidros e dão fotos de alta qualidade. Para os amadores, agora incluindo Kodak, há uma enorme linha de maquinas menores e mais simples que usam filme em rolo 620 e 120 (mas igualmente complicadas de usar).
Graflex – câmaras reflex (com espelho) com filmes de grande formato, de madeira e com muitos recursos para uso profissional.
De caixão Kodak numero 1, 2, 3, 4 júnior e Brownie, Agfa Preiss box. Para amadores e crianças, de caixote, com filme em rolo simples de usar, mas com qualidade sofrível.
Detetive (magazine Câmera) – são grandes e curiosas maquinas francesas de formato caixote, que tiram dez fotos com negativos de vidro tamanho 9x12, sem necessidade de recarga.
Stéreo (Stereolette) – moda no inicio do século, as maquinas alemãs de duas lentes tiram duas fotos simultaneamente de um mesmo assunto. Ao ser vista por visor apropriado, produz efeito estéreo.

1930/1940

35 mm - Desenvolvimento da Leica alemã (pronuncia-se Laica), pioneira no uso de filme 35 de cinema.
Zeiss Ideal, com chapas de vidro e Super Ikonta, com foco por telêmetro com filme 120, ambas produzem fotos de alta qualidade.
Rolleiflex, Ikoflex e Voigtländer 6x6 – de duas lentes, uma para o foco, a inferior para impressionar o filme; praticas de usar, as lentes alemãs dão alta qualidade às fotos.
Robot – máquina americana 35 mm, usa motor a base de corda para avanço rápido do filme, muito usada em foto esportiva.
Minox – máquina alemã subminiatura, foi usada em serviços de espionagem, usa filme próprio tamanho 9,5mm. Continua em produção na Europa, com modelos eletrônicos.
Maquinas de baquelite (como a Baby Brownie) – fabricados num novo tipo de plástico, o baquelite (por sinal muito quebradiço), ela usa filme 127, mas são inúmeros modelos que usam filme 120. Simples e praticas de usar, popularizam a foto entre amadores e crianças.
Máquinas de caixão (Zeiss Box Tengor) – usam filme em rolo 127 ou 120, fabricadas em metal, custavam pouco e eram fáceis de usar.
Paubel Makina usa filme em rolo 120, tem lentes intercambiáveis e é pratica de ser usada em reportagens em geral.
Speed Graphic – são as grandes máquinas americanas que susam negativos de celulóide tamanho 9x12 cm, usadas no fotojornalismo em geral, para documentar a II Grande Guerra e também fotos de artista e de esporte. Usam lâmpadas tipo bulbos, que se queimam a cada foto, são grandes, pesadas e complicadas, as dão fotos de alta qualidade.

1950-1960

Zeiss Ikon e Voigtländer – auge das maquinas de fole, usam filme 120 e têm capacidade para 8, 12 ou 16 chapas, dependendo da máscara interna que usar. Dão fotos de qualidade desde que a imagem no papel não seja maior que o negativo.
Máquinas caixão (Kapsa nacional) – a alegria da criançada são de papelão ou metal, muito simples e tiram fotos no tamanho 6x9 ou quadrada.
Maquinas de plástico (Brownie Fiesta Kodak) – surgem as primeiras maquinas 6x6 totalmente em plástico, com lentes muito limitadas, que dão fotos de qualidade aceitável.

 

 

1960 – 1980        

Rolleiflex e Yashica modelo D e Mat – popularização das maquinas de formato 6x6 (com filme 120), tiram 12 fotos de qualidade, mas são lentas e trabalhosas de operar. Época das grandes ampliações conhecidas como “Pôster” (tamanho 50x60) os negativos 6x6 são ideais para elas.
35 mm compactas (Beirette, Canon (Canonette), Minolta, Olympus) – época das pequenas máquinas com visor direto e foco por telêmetro, com lentes luminosas e muitas regulagens. São boa qualidade a foto, mas são difíceis de usar.
35 mm reflex (Pentax, Nikon, Canon, Minolta e Yashica) – marca a chegada das máquinas de uma única lente, com enquadramento através da objetiva. Permite o uso de objetivas como grande angulares e teleobjetivas potentes além de motordrive para transporte rápido do filme.
Kodak Rio 400 – marca a entrada da Kodak na fabricação de maquinas no País. A Rio 400, lançada em 1965, moderna e com poucas regulagens, popularizou a fotografia no Brasil abrindo o mercado para uma vasta linha de maquinas Kodak, incluindo a família Instamatic (filme 126) e as pequenas Xereta que usam filme 110.
Maquinas miniatura (Minolta 16 mm e Yashica Atoron) – usam filmes de 16 mm e menores são facilmente dissimuláveis. Mas seu uso era para fotos domestica e em viagens.

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